terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

É Portugal ninguém leva a mal - Opinião - DN

É Portugal ninguém leva a mal - Opinião - DN

Passei o dia a assistir (rádios, televisões...) à velha definição dos tolos: aponta-se a Lua e eles olham o dedo. O dia foi dedicado aos primeiros 70 portugueses que se preparavam para abandonar o Egipto. Abriram--se os noticiários com acentos épicos: que eles partiriam hoje às 10.30 locais - e estas são 08.30 de Lisboa, disse-se com exactidão, talvez para eu saber a que horas teria de começar a roer as unhas... Olhem, no Egipto há 30 mil turistas britânicos e em nenhum jornal inglês vi catapultado o seu repatriamento para primeira notícia; há 90 mil americanos e o New York Times tratou os voos de repatriação como notícia secundária; os espanhóis El País e El Mundo também foram discretos... Sabem porquê? Pelo critério da proximidade, essa lei que faz privilegiar uma notícia próxima em relação a uma longínqua. Para os ignorantes, esse critério fê-los pensar que o turista nacional é que é importante. Seria, se não houvesse o que há. Mas a magnitude dos acontecimentos egípcios é tal que os jornais sérios perceberam que é ela que porta em si a proximidade: ela pode mudar a vida do mundo, de nós todos. Por isso, nos países civilizados a irrelevância das férias encurtadas foi posta no seu lugar secundário. Mas não tenho ilusões, por cá, hoje (dia da grande manifestação cairota), vou passar o dia a ver microfones estendidos ao horror da viagem num barulhento C-130 chegado à Portela.

Ferreira Fernandes,DN 1/2/11

Comentário: a questão do essencial e do acessório é essencial em edição. Porquê? Porque a escrita e a publicação de um texto são isso mesmo: opção, escolha. E quando uma pessoa tem de optar entre uma opção e uma escolha, who you gonna call? Por isso se fala, tanto para livros como para a TV, em "critérios editoriais".

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